quinta-feira, 14 de abril de 2011

Motivação: O estímulo reforçador como função de outros eventos ambientais.

Na Psicologia tradicionalmente se estuda motivação como algo interno, "conceitual" que impulsiona o individo a fazer algo. Mas na Análise do Comportamento, sabemos que o comportamento é função do ambiente, ou em outras palavras, o responder do organismo é função de variaveis externas que aumentam sua probabilidade de emissão. Resta-nos saber como é que o ambiente controla o comportamento.
Uma forma de controle é a "eliciação" em que o ambiente "Causa" uma resposta em 100% das vezes.
Outra forma é o controle operante, em que o responder fica sob controle de suas consequencias, que aumentam a probalidade desse se repetir novamente.


Dentre algumas perguntas plausíveis a se fazer é, como esse responder fica sob controle dessa consequencia, também chamada Estímulo Reforçador (Positivo ou Negativo)?
Uma teoria que existia até então era de que o organismo nascia "sensível" a certos eventos ambientais, "reforçadores incondicionados" como Aguá, Comida, Sexo, Calor, etc... E todos os outros ganhariam a função reforçadora posteriormente através do condicionamento clássico (S-S).
Mas é correto também afirmar que dependendo o evento anterior ao responder esses estímulos reforçadores tendem a ficar mais "fortes" ou "fracos", podendo até mudar de função.
Por exemplo:

Se estou desde que acordei sem comer (Somando uma noite dormida de 7h em que também eu não como) e já são 10:50, uma bela refeição se torna um reforçador e qualquer comportamento que anteceda eu comer será reforçado com a ingestão do alimento.

Porém se já acabei de comer, e me ofereçem mais comida, essa mesma comida não terá mais função de me reforçar, e poderá inclusive ter funções aversivas dependendo o quanto comi. Me sinto inclusive nauseado.

Destes exemplos podemos observar que:

a) O tempo que fiquei sem comer foi uma variável que estabeleceu "Comida" como reforçador, amplificando sua força, além de evocar classes de operantes que tenham sido reforçados por comida.

b) Todos os Operantes que me levem a Comer, serão reforçados pela comida.

c) Minha capacidade de ingestão de comida tem um limite, e a partir dele me sinto satisfeito, ou Saciado.

d) A partir do momento que estou saciado, a comida não funciona mais como estímulo reforçador, ou seja o comer vai deixando a comida pouco a pouco menos reforçadora, até chegar a extremos de se tornar aversiva.

Dizemos que em a eu fui motivado pela privação do alimento (e não pela fome, a fome é apenas um conjunto de respondentes eliciados pelo vazio do estomago, queda nos níveis de açucar, etc. sendo estes produtos da privação de alimento, fome e comer são produtos da privação, a fome não é variavel independente do comer), sendo que a privação de alimento estabeleceu o valor reforçador para a comida.

Privação de comida é uma Operação Motivadora do Tipo Estabelecedora Incondicionada.

Incondicionada, pois por seleção natural as espécies adquiriram uma caracteristica de estarem sensíveis a eventos antecedentes ao seu responder com efeitos estabelecedores e abolidores de outros eventos ambientais posteriores ao responder. Uma criança não precisa aprender a ter o valor da comida estabelecido para ter seus operantes relacionados ao comer reforçados ela já nasce com essa capacidade herdada de seus ancestrais.

Dessa forma abriu-se um campo de estudos novo, o das Operações Motivadoras, que teve como seu grande expoente e fundador Jack Michael em seu primeiro artigo de 1982 intitulado Distinguishing between discriminative and motivational functions of stimuli (Diferenciando as funções motivacionais e discriminativas do estimulo).

Em um artigo recente Michael (2000) propõem uma taxinomia para tratar os diferentes tipos de Operações Motivadoras:




Operações Motivadoras: É o nome genérico dado a eventos antededentes que alteram o valor do estímulo reforçador, podendo aumentar ou diminuir, além de evocar classes de respostas contiguas ao estímulo reforçador.
Operações Estabelecedoras: São as operações motivadoras que aumentam a força de um estímulo reforçador.
Operações Abolidoras: São operações motivadoras que diminuem a força de um estímulo refoçador, podendo inclusive o tornar aversivo, além de suprimir classes de respostas contiguas ao estímulo aversivo.
Operações Estabelecedoras/Abolidoras Incondicionadas: São operações motivadoras que ocorrem sem treino prévio, possuindo o organismo "sensibilidade" a operação.
Operações Estabelecedoras/Abolidoras Condicionadas: São eventos ambientais que adquirem função motivadora por condicionamento clássico.

É importante também frizar aqui que as OMs não podem ser confundidas com estimulos discriminativos ou condicionais, pois estas não sinalizam a disponibilidade de reforço (como é o caso do Sd e do Sc), mas alteram o valor reforçador de eventos ambientais.

Comida estará reforçadora pra mim se estiver privado na sua presença ou na sua ausência (Privação é OM), mas só poderei comer se elas estar na minha presença (Visualização e Disponibilidade de Comida é Sd).

Com essas contribuições a análise do comportamento ficou muito mais complexa e contextualizada, sendo que essa análise pode ser extendida ao comportamento verbal. Operantes Verbais podem ganhar função de OMs, desdes operantes alguns podem estar encobertos, amplificando a complexidade de quem visa lidar com o comportamento humano em clínica por exemplo.

Darei um exemplo do que aconteceu comigo, outro dia uma amiga levou um sanduiche na faculdade e me ofereceu um pedaço (eu não estava privado de comer, tinha acabado de Jantar). Eu então perguntei: - De que é? Ela me respondeu o sabor do Sanduiche. Então eu disse: - Não, obrigado.

O Sabor que ela me disse (ou seja o operante verbal tato dela), diminuiu o valor reforçador do sanduiche, e suprimiu meus operantes verbais do tipo "pedir um pedaço".

Operantes Verbais, e outros eventos, podem ser condicionados a Operações Motivadoras e ganharem inumeras funções de modular o valor do reforço e da punição, tornando estes, não eventos discretos "a priori" mas como pontas de um continum:

7 comentários:

  1. Concordo que a comida pode não reforçar certos comportamentos conforme certas condições (p. ex., saciação). Mas comemos mais ou menos não em função de um valor de reforço ATUAL alterado. Uma explicação melhor seria a de que deixamos de comer quando saciados porque, no passado, fazê-lo não foi devidamente reforçado (fazê-lo, pelo contrário, pode ter sido aversivo, e portanto o evitamos em função de reforçamento negativo). É verdade que as operações motivadoras (ou os "estados" atuais de um organismo) definem se um estímulo será mais ou menos reforçador... mas a explicação para um comportamento atual deve levar em conta uma aprendizagem pregressa, e não a inferência de algo que ainda não ocorreu.

    Não sei se deixei claro o meu ver sobre esse problema, mas acho que seria melhor lançarmos mão de uma história pregressa (p. ex., de um reforçamento negativo) para explicar um comportamento, bem como e portanto de falarmos de uma "alteração na função do estímulo" em vez de "alteração no valor do reforço" (ao menos quando esta afirmação faz uma inferência sobre o futuro, isto é, sobre o efeito imediato da comida sobre um possível comer).

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  2. Muito boa sua colocação Daniel,

    Realmente o que diminiu a frequencia do responder em relação a comida após uma OMA de saciação é uma contingência de punição positiva (a comida quando tem seu valor alterado passa a punir e não mais a reforçar).

    Aliás, contingências aversivas são consideradas OMs por Michael.

    Por exemplo:

    Quando adiciono um estimulo aversivo no ambiente de um organismo, eu estabeleço a diminuíção ou eliminação daquele estímulo (o resultante da fuga) ou quando devido a histórias pregressas um outro estímulo passa a sinalizar este estímulo aversivo (Pré-Aversivo)e o organismo passa a evita-lo (esquiva) como reforçadores.

    Acho que o grande ganho das OMS é tirar de foco os "Estados Internos" e colocar novamente no ambiente a determinação do comportamento, no que diz respeito a alteração de valor de reforçadores.

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  3. E alêm do mais respondendo a sua crítica (Construtiva) só posso inferir que algo é uma OM, analisando seu efeito pregresso sobre a taxa de respostas.

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  4. ótimo texto! ajudou bastate.
    hannah nassif jaber magalhães

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  5. Boa noite, gostaria de saber as referências utilizadas para este texto. Estou envolvida em uma pesquisa relacionada ao tema, e preciso de bibliografrias. É um assunto muito atual e pouco pesquisado. Dicas são bem vindas. Obrigada.

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  6. Olha, usei um curso que tive na ABPMC 2009 com os alunos da Téia, junto a isso usei os artigos desta pesquisadora aqui!

    http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=W1086

    Quem quase toda a vida acadêmica dedicada a pesquisas sobre este conceito...

    Junto também ao Jack Michael

    Espero ter ajudado, abraço!

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