Falar sobre a mente em uma perspectiva behaviorista radical já criou muitas controvérsias, inclusive foi afirmado por seu eminente criador B. F. Skinner que ela não existiria. Mas para entendermos em que Skinner se baseou para fazer esse tipo de afirmação devemos entender como ele o conceito de mente e suas derivações.
Quando alguém diz mente, ao que se refere?
Descartes filosofo Frances investigando que tipo de conhecimento poderia ser dito com certeza total através da duvida metódica, descobriu que quase todas as coisas poderiam ser duvidadas menos o próprio ato de duvidar, o pensar em si. Portanto concluiu em sua famosa frase “Penso logo Existo” que o pensamento era um “ser” algo que existia e que dele derivavam todas as outras existências. Esse ser habitava dentro do individuo sendo associado ao conceito de “alma”, algo imaterial que dava vida e movimento ao corpo mecânico.
Segundo Descartes a “Mente” movia o “Corpo” através da “Glandula Pineal” uma espécie de conversor de Mente em Matéria, situada no cérebro. (Lógico tudo isso sem evidencia nenhuma).
Depois de Descartes vários filósofos e psicólogos atribuíam a mente a explicação dos comportamentos humanos, foram criadas inúmeras teorias sobre o funcionamento da mente, como ela poderia agir sobre o corpo, etc.
Dentre as teorias Mentalistas, ou seja, que atribuíam a Mente um papel causal, esta o Paralelismo Psicofisico, a Psicanalise, o Funcionalismo Mental, dentre outras.
Com o surgimento das primeiras pesquisas de Pavlov e seus estímulos condicionados, e posteriormente com as demonstrações de Watson de sentimentos aprendidos, a Mente perdeu sua função sobre comportamentos simples que antes eram ditos que pertenciam a “Instintos” passou a governar apenas aqueles que tinham “Intencionalidade” e “Volição”.
Quando os neo-behavioristas, como Guthrie, Hull e Tolman passaram a explicar comportamentos cada vez mais complexos através de relações dependentes entre o meio e o organismo, a Mente foi se recolhendo mais e mais para dentro de sua concha de obscurantismo. Ela passou a ser, graças a tendência iniciada por Turin de ver computadores em todos os lugares, um processador de estímulos “imputs” que após passarem por ela a nova mente chamada “Cognição” saírem “Output” como respostas. Segundo esses estudiosos a cognição está no cérebro, ou emerge dele. Dando origem ao que hoje é conhecido como Cognitivismo.
Porem outro neo-behaviorista preferiu não adotar esse modelo computacional e se ater aos dados, indo na contramão dos seus amigos neo-mentalistas ele se tornou radicalmente comportamental. Skinner formulou um conceito “O comportamento Operante” e um modelo causal “Seleção pelas conseqüências” que definitivamente excluíam a mente de um papel causal ou processador, a transformando em uma fábula, um folclore psicológico.
Skinner não excluiu porem eventos ditos “Mentais”, pois esses são fenômenos inegáveis, o que ele propôs foi uma metodologia e campo conceitual para explicar tais fenômenos de forma contextual, ou seja, como comportamentos (respostas em relação com contexto ambiental).
Partindo de sua análise, Skinner transforma substantivos como pensamento, sentimento, visão, raciocínio, inteligência em verbos ou adjetivos como Pensar, Sentir, Ver, resolver problemas, comportamento inteligente, etc.
Seriam todos comportamentos, ou qualitativos de comportamentos aplicados em contextos específicos de ocorrência, e não causas internas desses comportamentos.
Por exemplo Inteligência que é o carro chefe do cognitivismo.
Um organismo emite respostas em contextos, dessas respostas algumas são selecionadas por suas conseqüências, tornando conforme o numero de reforçamentos o organismo mais “eficaz” para produzir suas conseqüências.
Pois bem, o ser humano é um organismo verbal, e dentre seu repertório verbal existe uma classe de comportamentos que se chama tacto, que é basicamente o comportamento de “descrever o mundo” que está sob controle antecedente de estímulos ambientais não verbais e que é reforçado por sua correspondência com os mesmos pela comunidade verbal.
Costumamos tatear pessoas que são eficazes de obter reforçadores em alguns contextos com o operante verbal “Inteligente”.
Dizemos a um menino que tirou 10 em uma prova de Matemática:
- Nossa como você é inteligente.
Estamos assim tateando sua eficácia qualificando o menino como inteligente. Se pensarmos assim não tem problema nenhum e realmente não tem, não precisamos mudar nossa linguagem comum (O vernáculo) neste caso, pois não está incorreto.
O erro começa quando é dito que o menino tirou 10 PORQUE É inteligente, pois isso não passa de uma proto-explicação circular, teleologia.
Outro erro, e esse é mais grave, é dizer que o menino acertou porque TEM INTELIGÊNCIA.
Analisando os enunciados podemos ver claramente os erros:
No primeiro caso apenas qualificamos seu comportamento.
No segundo tentamos explicar, mas não explicamos nada.
No terceiro porem cometemos o erro de inventar uma entidade chamada Inteligência que causa o comportamento eficaz “inteligente”. É o que os cognitivistas fazem até hoje, eles dizem que a inteligência é algo, uma coisa, que existe e causa comportamentos inteligentes, e que ela se situa no cérebro (qualquer semelhança com Descartes não é mera coincidência). Quando a eficácia ou não do menino só pode ser explicada por sua história de relações com seu ambiente, escolar, jogos educativos, televisão, etc... Que vai pouco a pouco modelando seu repertório comportamental de resolver problemas (e não exercitando ou adubando sua mente/cognição).
Essa analise foi feita com o conceito de inteligência mas pode ser feita com qualquer outro mental.
Outro conceito normalmente citado pelos defensores do mentalismo é a subjetividade. Dizem que a eventos que somente o observador pode experimentar portanto isso é um indicio que a mente existe, pois é ela quem vê o subjetivo.
Para tratar disso Skinner abre mão do conceito de eventos privados, que basicamente são comportamentos que ocorrem em um nível de observação inferior ao publico, não se tratando de uma realidade mental.
O Pensar para o behaviorismo radical é comportamento operante verbal que acontece em um nível de observação possível somente ao próprio emissor, mas que possui necessariamente uma parte publica, pois foi aprendido de forma publica e é mantido por estímulos públicos.
A isso pode se incluir o ver, o ouvir, o sentir, etc...
Todos relações comportamentais com o ambiente.
Sejam elas operantes (pensar, imaginar, sonhar, delirar, alucinar..) ou respondentes (sentir, ver, ouvir...) todas funções de eventos ambientais.
Dessa forma o conceito de Mente fica sem utilidade na Psicologia, apenas uma palavra vazia de uma era pré-científica como o flogisto que antes pertencia a alquimia (protociencia que deu origem a química) e vis viva da biologia.
Parabéns pelo texto, Marcos. Acho que posicionamentos críticos e aberturas para discussões sobre temas dessa natureza tem faltado ultimamente. E como sou mais afim ao cognitivismo do que ao behaviorismo, devo fazer algumas considerações.
ResponderExcluirPrimeiramente, ser mentalista não é necessariamente ser dualista. Tratar a cognição como um conjunto de mecanismos relativamente especializados e modelados pela seleção natural é uma postura patentemente monista. Em segundo lugar, e como discutimos outrora, análises como as feitas pela Psicologia Diferencial reclamam da mente -- ou do cérebro -- um poder causal. P. ex., parte das diferenças de inteligência entre João e Pedro é devida à diferença na capacidade de armazenamento imediato de informação (o que poderia, no nível neurobiológico, corresponder em parte à diferença de extensão do córtex visual primário, p. ex.). Nesse caso, portanto, e contrariamente ao que você concluiu, estaríamos explicando alguma coisa.
Por falar de inteligência, vale lembrar que a tratamos mais como uma capacidade do que como uma coisa. Por inteligência chamamos a capacidade de aprender, de raciocinar e de resolver problemas. Mesmo que boa parte dessas capacidades decorram da experiência, não é menos verdade que as alterações de comportamento dela decorrentes co-variam com as mudanças do encéfalo. Em outras palavras, pessoas que se comportam mais inteligentemente certamente possuem encéfalos -- ou mentes -- diferenciados.
A respeito da sua conclusão, estou escrevendo um texto que trata um pouco da postura eliminativista, onde vou tentar mostrar que os conceitos psicológicos não poderiam ser simplesmente substituídos pelos conceitos da neurociência de ponta -- inclusive o conceito de mente.
Um abraço, meu caro.
Obrigado pelo comentário Daniel, vc é sempre bem vindo!
ResponderExcluirNão discordo do seu posicionamento de que:
"Mesmo que boa parte dessas capacidades decorram da experiência, não é menos verdade que as alterações de comportamento dela decorrentes co-variam com as mudanças do encéfalo"
Mas trata-las como variaveis independentes foge um pouco, pois são abstrações de processos mais simples, que acontecem em função dos 3 níveis de seleção e não como iniciadores, alêm de certa forma ignorar variáveis ambientais/contextuais.
Funciona bem em testes, e avaliações de desempenho de aprendizado, resolução de problema, criatividade, etc.. mas não funciona bem na especificação e ensino de comportamento inteligente.. é meu ponto de vista..
Abraço!
Para o behaviorismo o cérebro é função do comportamento e não iniciador.
ResponderExcluirEle foi selecionado de sistemas nervosos mais simples, também com função comportamental de responder ao meio.
Ele é modificado pelas contingências de cada organismo no aprendizado.
Não existe uma divisão entre cerebral e comportamental, quando ocorre uma mudança comportamental no organismo ao mesmo tempo (isso é importante) ocorre uma mudança no cérebro (e em outras partes também) isso faz parte da função cerebral em contingências de seleção natural.
Ajudar o organismo a se adaptar tornando-o apto a responder cada vez melhor ao seu ambiente.
No caso de buscar que variáveis determinam IMEDIATAMENTE a DIFERENÇA de rendimento cognitivo entre duas pessoas, não haveria outro lugar para encontrá-las -- ao menos em um ambiente razoavelmente controlado -- do que no encéfalo -- ou na mente. Veja que eu não estou tratando de problemas como "iniciar um comportamento" -- é indubitável que aquele decorre da interação organismo-ambiente.
ResponderExcluirO ponto cego dos lados, Marcos, ao menos conforme eu o percebo, é sobretudo epistemológico. Os behavioristas usam as lentes contextualista e histórica para entender o comportamento; os cognitivistas, as lentes estruturalista e -- em um outro sentido -- funcionalista. Parece que a explicação mais completa e efetiva requer o uso de todas essas lentes -- sem contudo fazer uma salada de frutas. Na Psicologia Cognitiva, p. ex., e embora eu ainda não esteja por dentro, estão dizendo de uma tal "cognição situada", pela qual tentam abordar o aspecto contextual do comportamento. Pelo lado da AC, por outro lado, eu não sei se embutir um pouco de estruturalismo em seu repertório teórico seria viável -- ou desejável.
Um abraço.
A psicanálise também é monista e materialista, no sentido de que rejeita todo e qualquer tipo de espiritualismo. Freud asseverou diversas vezes que os processos psíquicos dos quais tratava eram abstrações de processos cerebrais (mas ainda assim, desde o início da psicanálise defendeu que não era útil para a psicologia render-se ao uso do vocabulário da neurologia).
ResponderExcluirQuanto a dizer que a psicanálise é mentalista (no sentido de que os comportamentos são causados/iniciados por um entidade mental interna), isso só procede se assumirmos que, para a psicanálise, a "entidade" causadora dos comportamentos é a pulsão e que esta, segundo Freud, provém do próprio corpo.
Tudo isso para dizer que concordo com o Daniel: nem todo mentalismo é dualista. Aliás, pelo que tenho percebido, neuropsicólogos, psicanalistas, analistas do comportamento, fenomenólogos, sócio-históricos, sistêmicos... nenhum psicólogo sério hoje em dia trabalha com uma perspecitva espiritualista de mente/subjetividade.
O problema que a Análise do Comportamento tem que enfrentar não é a crendice cartesiana na existência de uma entidade mental, pois nenhum cientista acredita mais nisso. O grande desafio para a Análise do Comportamento é provar que sua tese está correta, isto é, sua tese de que modelos mentais são pouco produtivos para a psicologia e de que tudo que diz respeito ao homem pode ser explicado nos termos da tríplice contingência (afinal de contas, é justamente isso que a expressão "radical" quer dizer: levar o behaviorismo às últimas consequências, literalmente).
No mais, Marcos, parabéns por mais um excelente post.
Abraços psicoloidicos! o/
Gostaria de fazer parte desta história.
ResponderExcluirObrigado Psicolóide!
Psicolóide..
ResponderExcluirConcordo com hoje em dia os mentalistas em sua maioria não são dualistas, porem na faculdade é comum ver as professoras (Psicologas/Psicanalistas) ensinando uma visão de mentalismo dualista.
E na minha opinião, enquanto houverem explicações mentalistas haverá interpretações dualistas.
"...porem na faculdade é comum ver as professoras (Psicologas/Psicanalistas) ensinando uma visão de mentalismo dualista."
ResponderExcluirVerdade. Parece que alguns dinossauros epistemológicos insistem em resistir à extinção. ;)
"...enquanto houverem explicações mentalistas haverá interpretações dualistas."
Talvez. Mas enquanto a Análise do Comportamento não apresentar uma explicação útil e convincente para o fenômeno da linguagem, certamente o mentalismo terá seu espaço garantido na psicologia. Vamos torcer para o quadro mudar logo.
Em que a abordagem da Análise do Comportamento é deficiente quanto ao tratamento da liguagem?
ResponderExcluirDe que consiste a crítica cognitivista moderna?
Eu não diria que a Análise do Comportamento é deficiente quanto ao tratamento da linguagem, e sim que ela ainda é incipiente.
ResponderExcluirMas talvez seja apenas uma questão de tempo para que o behaviorismo se torne mais sofisticado nessa área. Ainda mais com propostas tão promissoras e inteligentes como as feitas por Sidman.
O estudo da equivalência de estímulos e das matrizes relacionais são, na minha opinião, o futuro da AC. Especialmente porque eles direcionam a atenção dos analistas experimentais para campos até então ignorados graças à forma rudimentar com a qual Skinner tratava os processos simbólicos.
Esse é o meu parecer. Posso estar enganado. Isso faz sentido para você e para seus colegas analistas?
o/
Vc citou os estudos sobre equivalencia de estimulos e quadros relacionais, propostas essas que não saem da filosofia Skinneriana.
ResponderExcluirQuando a proposta de Skinner ser incipida quanto a linguagem, discordo.
Em seu livro Comportamento Verbal, Skinner já da dicas de campos a serem investigados para detalhar mais sua analise e interpretação do fenomeno linguistico. Como a multideterminação do comportamento verbal, o estudo dos autocliticos, os tatos estendidos, metaforicos, metonimios, etc...
Mas eu acredito que em breve faremos frente as teorias mentalistas com uma analise radicalmente behaviorista no campo da cognição, subjetividade e linguagem.
"Mas eu acredito que em breve faremos frente as teorias mentalistas com uma analise radicalmente behaviorista no campo da cognição, subjetividade e linguagem."
ResponderExcluirAguardo ansiosamente. ;)
Muito bom o post e os comentários!!
ResponderExcluirHá uma corrente no Behaviorismo Radical, aqui mesmo no Brasil aliás tem, que diz que devemos falar de mente sim.
ResponderExcluirUm grande nome como J.A.D. Abib até publicou este artigo, onde clama os behavioristas a entrar na roda da "Filosofia da Mente":
http://www.scielo.br/pdf/prc/v16n1/16800.pdf
Contudo, esse tópico divide opiniões, assim como a polêmica sobre as metacontingências, instaurada por Glenn.
Há ao menos 2 grupos de interesse na questão "Falar de mente no Behaviorismo":
a) pessoas que acham que Abib está certo, pois assim aumentaríamos a comunicação com os mentalistas, abrindo portas academicamente falando
b) pessoas que acham que isso é arriscado pois usar o termo altamente carregado "mente" só iria confundir as coisas... Seria melhor falar de outros termos, distintos, para demarcar e tornar a comuninicação imune a mal-entendidos.
Particularmente, estou no grupo "b", mas conheço gente bem favorável ao "a".
Seja como for, a saída Pragmatista ainda me parece a mais bem sacada: ganhará o grupo que oferecer melhores alternativas práticas derivadas de suas idéias. (E ainda não sabemos que grupo é esse).
Conheço esse artigo do Abib, muito bom por sinal.
ResponderExcluirTambém sou da perspectiva "b", mas é necessário entender a perspectiva "a" para poder substituir os termos mentais por termos behavioristas na ciência e também para poder entender quando um mentalista fala de um aspecto "mental" de que topografia e função de comportamentos ele está se referindo.
Seria tipo um "entender o inimigo para desmontar suas teses".
Obrigado Alessandro volte sempre!
Sou estudante de psicologia e me interesso pelo Behaviorismo e gostaria de saber se vocês podem me indicar textos ou livros que me ajudem a ter uma melhor compreensão das ideias contidas no livro de Diego Zilio - A Natureza comportamental da mente: Behaviorismo Radical e Filosofia da Mente. Grata e estou ansiosamente aguardando a ajuda de algum de vocês.
ResponderExcluirOlá, desculpe não responder antes.. só vi seu comentário agora... hehe
ResponderExcluirNão li esse livro do qual você se refere... mas um bom livro introdutório para entender a filosofia da mente do behaviorismo é o Compreender o Behaviorismo do Willian Baum lá você encontrará milhares de referências de outros autores como Wittgeinstain, Ryle, etc...